domingo, março 01, 2009

PG tem 80% de presos reincidentes



Levantamento no Cadeião do Santa Maria aponta que 0,25% dos presos tem ensino superior
Publicado em: 01/03/2009 00:00
Gisele Wardani de Castro
Levantamentos da direção do Mini-Presídio Hildebrando de Souza, o Cadeião do Santa Maria, mostram uma realidade preocupante à sociedade. O índice de reincidência de detentos em Ponta Grossa chega a 80%. "É comum o preso receber alvará de soltura pelo juiz, ser liberado e dias depois retornar à prisão", revela o chefe da carceragem, Jorge Teixeira. Segundo ele houve caso em que poucas horas depois de deixar a carceragem, o detento foi novamente preso em flagrante. "A grande maioria tem envolvimento com o tráfico e o vício acaba levando à reincidência, isso ligado à falta de oportunidades que o preso encontra quando tenta voltar ao convívio social", define Teixeira. As oportunidades de trabalho são quase nulas. "Para quem concluiu Ensino Médio e tem algum curso profissionalizante o mercado de trabalho já é difícil, e aqueles que têm antecedentes criminais acabam encontrando novamente no crime a chance de sobrevivência", complementa.
O juiz corregedor da Vara de Execuções Penais (VEP), Antônio Acyr Hyrcyna, diz não há estudos específicos sobre a reincidência dos detentos na cidade, mas garante que o índice é preocupante. "O sistema é deficiente e torna deficiente também a execução da pena em si, pois não oferece condições de ressocialização ao ex-detento que volta a delinqüir", destaca o magistrado. Independente da estrutura em que o detento cumpre pena de reclusão hoje, completa Hyrcyna, a ressocialização é um desafio tanto para os presos quanto para a sociedade. De acordo com ele, o índice de reincidência é o mesmo tanto no Cadeião do Santa Maria, que enfrenta mais que o dobro da superlotação, quanto na Penitenciária Estadual de Ponta Grossa (PEPG), que tem 410 detentos em regime fechado, e é considerada uma estrutura de segurança máxima, com espaço e quadro de funcionários ideal. "Apesar de não haver levantamentos, pela experiência do dia-a-dia percebemos que sempre os mesmos voltam à prisão", destaca.

Mudança não depende só do Judiciário
O superintendente da 13ª Subdivisão Policial, Élter Taetz Garcia, acha que o sistema carcerário precisa ser todo modificado. "Mas isso não depende do Judiciário ou da polícia, que apenas fazem cumprir a legislação". Ele reforça que o índice é preocupante e destaca que este é o retrato de que o sistema não funciona. "O objetivo da pena de reclusão é reintegrar o infrator à sociedade, mas não é possível afirmar que o sistema está cumprindo o objetivo". Ele cita um estudo do professor de Direito Penal da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Juarez Cirino dos Santos, especialista em criminologia, que avalia o índice comprova que sistema é 'falido'.
O empenho para mudar a realidade depende tanto dos poderes Legislativo e Executivo quanto da sociedade. "A pena de encarceramento não pode ser a única resposta para o combate ao crime, é preciso haver engajamento do Executivo, na construção de estruturas adequadas, do Legislativo na modernização das leis e, principalmente, a participação da sociedade cobrando e fiscalizando os poderes constituídos", completa.

Sociedade tem medo e fecha portas a ex-detentos
"A prisão é o fundo do posso, a porta para o inferno, mas hoje estou regenerado porque encontrei Deus e tive uma oportunidade que agarrei com as mãos e quero mudar de vida". A declaração é de Vlamir Pascoal Gomes, 38 anos, condenado a oito anos de reclusão pelos crimes de furto e roubo. Ele já cumpriu metade da pena e deve receber alvará de soltura no próximo mês. Depois de quatro anos no regime fechado, passou a trabalhar na cozinha do Cadeião Santa Maria. "O assunto na cadeia é o crime, a droga, mas muitos procuram oportunidades para superar o passado trágico". Mesmo com uma carreira de vendedor, tendo 20 anos de carteira assinada atuando em imobiliárias e concessionárias, ele tem a certeza de que ao sair da cadeia terá de agarrar a primeira chance de trabalho que aparecer. "Já tenho expectativa de emprego na construção civil, pois em outro setor, em qualquer empresa o requisito para contratação é a ficha de bons antecedentes criminais", fala.
Vlamir tem a certeza de que poderá retornar à cadeia, porém como voluntário ou visitante. "Mas como detento nunca mais", reforça. Campanhas de incentivo à contratação de detentos representam, para ele, um bom começo. "Propagandas estão sendo veiculadas e este pode ser um caminho para que a sociedade abra as portas aos detentos, pois ela não é culpada, mas tem medo do 'marginal', e isso tem que mudar". Ele garante que nem todos os detentos tratam o crime como profissão. "Pela convivência acredito que 40% dos presos hoje querem se regenerar e se não houver oportunidade o ciclo vicioso vai continuar", finaliza. Dos 385 presos do Cadeião, menos de 10% concluiu o Ensino Médio. Além disso, apenas um detento, que equivale a 0,25% do total, tem ensino superior. O engenheiro agrônomo, de 51 anos, cumpre pena de reclusão por homicídio. "Foi uma fatalidade em família e por ter estudo sei que terei grandes oportunidades de trabalho depois que cumprir minha pena, mas para quem não tem expectativas de levar uma vida digna ao sair corre o risco de reincidir e o que o preso precisa é de ocupação dentro da cadeia e oportunidade fora dela", destaca o detento.

Tratamento ao preso precisa ser humanizado
Taetz classifica o sistema como desumano. "Se houvesse participação e cobrança o tratamento seria humanizado". Estudos do Instituto Carioca de Criminologia, lembra Taetz, apontam a relação direta da oferta de vagas no mercado de trabalho com o aumento da população carcerária. "Em tempos de crise o número de presos aumenta à medida que o número de vagas no mercado diminui, e quando cresce a procura pela mão-de-obra diminui a população carcerária e é importante que esta relação seja detectada", considera. O chefe da carceragem, Jorge Teixeira, comenta, também, que a maioria dos detentos é jovem, com idade entre 18 e 30 anos. "São pessoas no auge da idade produtiva, precisam de oportunidades de produção, e é o que não podemos oferecer, pois a ociosidade e a superlotação que o sistema carcerário oferece destroem expectativas e instigam o jovem a se especializar no crime".


Fonte: JMnews


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